quarta-feira, 30 de junho de 2010

Não-Lugar

Uma vez apareceu um velho em algum lugar. Olhou, parou, sentou. E falou com seu tom de voz inigualável:
— Maldito homem animal! Maldito seja esse animal capitalista! Que mesmo tendo, abertamente, se livrado de todos os vícios do passado selvagem e criado tantos outros vícios para a sua intelectualidade não conseguiu se desvencilhar de um! Ah! Esse um... O maldito desejo animal! Pelo qual, fazemos tudo, pelo qual inventamos a diferença! Imagine se todos fossemos iguais, logo, todos seriamos aptos a tudo, poderíamos, todos, cumprir a nossa missão na Terra e seriamos felizes por isso! Porém a realidade não é assim tão utópica... Nem os animais, que primeira vista, são todos iguais o são! Eles têm que se mostrar mais interessantes, mais fortes, mais intimidadores, mais protetores, mais “corretos”, mais ricos!!? Seja uma coroa ou um título de propriedade, esse infeliz será mais feliz que nós! Ele estará mais apto a se reproduzir! Não sei como seria uma sociedade igualitária, não sei como seria a ética dessa sociedade, como funcionariam suas leis em relação às felações, será que seria uma orgia comunitária? Rodízio de casais? Rodízio de camaradas?! Porém esse mundo não existe... Não vai existir, vai contra a nossa humana de lei de livre concorrência liberal... O que importa é essa nossa mágoa, essa nossa tristeza criada por esse mundo opositor... Meu filho TENHA DINHEIRO E TU COMERÁS QUEM QUISERES! Mas com certeza você já percebeu isso, né? Mulheres são que nem passarinhos, vão e vem quando bem entendem, e nem adianta enjaulá-los, pois ninguém quer ver pequenos cantores tristes; nem feri-los, nem nada, apenas deixe um pouco de alpiste na sua sacada, para eles saberem que você é o cara, e pra voltarem mais vezes...
Ele terminou o seu discurso em nenhum lugar, ninguém de lá se quer aplaudiu, nem repudiou, apenas deixou passar, deixou voar as palavras ao vento. E no vento aquela voz grave, melancólica, triste, digna de um poeta foi ecoada para algum lugar longe de lá como cá. E assim o poeta itinerante foi embora, voando como um passarinho, procurando outro não-lugar para se pronunciar.

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