sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Contra o Espelho

Corpo, partido.
Espelho, tinindo,
Me mostra o abrigo
Daquele vazio.
D’um reflexo infindo,
Mostra-me espremido
Sozinho e pequeno.
Ligado num laço
Tão sujo quanto um nó
De cadarço.
Prendendo-me num delírio,
Tão delirante, tão indefinido,
Que me faz gritar ao relento.
O meu passado.
Afiado, gritado, chorado, explorado:
“Feio, porco, tosco, banal,
Idiota, estapafúrdio, ogro,
Mentecapto, imprestável,
Vagabundo; isso era o que
Me diziam. E assim eu
Fui crescendo e aceitando.
E comecei a beber e fumar,
Criei maus hábitos para,
Esquecer do que diziam.
No final, virei poeta...”
E assim vou me perdendo
Com discursos ao vento
Que não se somam, que não criam, que não servem para nada!
Lapsos de uma vida sem glórias.
Com pequenas esperanças como, talvez, ao voltar do trabalho:
Um breve trago (de uísque) e um cigarro.
Para tirar o amasso da cara, de dias mal vividos.
Sei que não sou o único a reclamar disso,
Muitos antes de mim já reclamaram.
E até fizeram sucesso, com seus blues,
Seus sambas, seus tangos, seus fados, seus punks!
Eles também reclamaram, ou deviam reclamar,
Dos frascos, dos troços, dos Marios, dos equinócios,
Das mulheres, das sequelas, das lanternas, dos talheres.
Que não me dizem nada!
E assim vivemos. Tão juntos, porém tão separados.
Como lobos alfas de suas respectivas alcatéias
De sonhos e angustias,
De medos e de faltas...
Falta de algo tão grande e tão indefinido, que uns falariam de fé.
Mas eu realmente não acredito nisso.
E assim vamos fazendo uivos poéticos
Para tentar conquistar aquela grande lua.