sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Claustrofóbico

Aprisionados
Na cela escura do esquecimento
Estamos nós.
Abaixo do nível do mar
Sujeitos a alagamentos:
O que alastra ainda mais,
O mau cheiro e o horror
Daquele cárcere sombrio!
Ai Deus! Se pelo menos houvesse uma luz!
Um quadradinho sequer!
Naquele alojamento retangular!
Apertado, quente e úmido!
Que somente o ar se deixa passar!
São poucos minutos que eu passo lá,
Mas soam como se fossem eternidades a sofrer.
Deus! Como queria eu morrer!
Para não entrar mais lá,
Naquele tênis que me dá falta de ar!

Minha Fuga

Muitas vezes eu saio desse mundo, me recolho no meu próprio universo, de belezas abstratas e de sons melindrados. Não é um mundo melhor do que o real, na verdade ele até é bem pior, a diferença mesmo é que eu prefiro o meu pior a o pior real. Pois o pior real também está empregado à hipocrisia, não digo que o meu pior também não tenha essa banalidade só que pra mim ele soa mais natural, diferente com a do outro mundo que soa muito forçado, às vezes nem era pra ter, mas tem apenas de pirraça.
São aqueles momentos em que eu não agüento mais ouvir aquele noticiário repetitivo, ou ler aquele boletim, com o furo de reportagem, que é sempre igual ao da concorrência. Quando o caos me parece monótono, ou até muitas vezes, bem engendrado, eu me desligo. Não suporto. Como pode me parecer haver uma desordem controlada? Não entendo, busco entender, não gosto do que leio ou do que ouço e simplesmente me desligo.
Fico olhando para a hélice do ventilador, que gira até bem rápido, ou fico olhando para fora da janela, esperando alguma coisa acontecer, ou paro pra ler algo que me faça pensar em outras coisas decorrentes sobre o mundo real. Tento entender o mundo por fora, com a minha trilha sonora. O trompete é o meu melhor amigo: sempre estalando forte aos meus ouvidos, vindo violento e delicado, ou delicado e violento, ou delicadamente violento, porém fugaz, nunca importa a ordem ele sempre será uma saída de escape pra mim. A minha abstração, a minha nave para o meu mundo de ideais e idéias intransponíveis, de coisas perfeitas. O Mundo Inteligível, fluido, líquido, perfeito, onde somente eu o entendo, cada vez mais perto do Sol.
Como sempre, o trompete cansa e para. E eu sou queimado pelo Sol. E eu caio de volta a esse Mundo Sensível, e volto a me machucar com as sombras que me circulam. E eu estudo pra entender o que eu já entendo, porém não lembro apenas abstrações esquecidas pela falta de jazz.
Sofro, tentando viver, engasgado num mundo em que a cada passo dado para frente, dão-se dois para traz. Isso só traz isolamento, perda de amigos, entes queridos, fome e desespero. O Sol me queima, mas mesmo assim eu quero chegar mais perto dele, ousando tanto quanto Ícaro. Só que eu sou mais esperto que ele, estou mais calejado que ele também, por isso larguei há tempos as penas e a cera, hoje em dia só vôo com minhas asas de metal, meus foguetes de trompetes.

Gordos Divinos

Deus deve ser gordo! E eu afirmo isso com todo o conhecimento de causa possível, pois se ele não fosse gordo porque ele faria todo gordo viver cheio de problemas? Tão perto da morte, ou de um problema de coluna ou de joelho ou de coração? Ele faz isso para que nós, gordos, não tenhamos o mesmo prazer de desfrutar de uma enorme, divina e resplandecente pança como a dele.
Deus é um cara chato. Ele não quer deixar os seus filhos felizes com suas barrigas felizes. Não quer deixar que a criatura se pareça com o criador, não quer nos deixar aproveitar desta nossa procedência divina. Por isso acaba com a nossa saúde, e também com as nossas vidas, sempre nos dificultando para tudo.
E é sempre assim, sempre que um gordo se da bem na vida ele logo que pode faz uma cirurgia, para reduzir o estômago ou para tirar a pança, pois a coluna há muito já reclama.
As pessoas acham gordos engraçados e na maior parte das vezes eles são, porque eles têm que ser engraçados. Eles acham na comédia um subterfujo para as suas vidas miseráveis, de fato o gordo é feliz porque tem que ser feliz e não porque é feliz. Você acha que é legal ter um pé ferrado, ou ter que operar um joelho, ou ter um problema na coluna apenas porque gosta de comer? Acha que é legal olhar pra baixo e não enxergar o dedão do pé? Você acha que é legal ter sido criado com problemas familiares ou ter problemas de relacionamento? Acha que é legal ser sacaneado a vida inteira só por ser gordo? Achas tu legal ter que escolher uma cadeira forte para não quebrá-la ou para não ficar preso a ela? Você acha legal sofrer esse escárnio, esse motejo, esse dichote, essa putaria!?
Por isso somos irônicos, sarcásticos e sempre criticamos a Tu, Criador malvado que esqueceu seus filhos mais perfeitos! Porque Tu não nos gracejas com a normalidade, ou pelo menos a verdade e comprova que de fato somos o elo real que comprova a ligação divida da criatura com o criador!

Não!

Não confie mais em mim.
Eu mesmo já desconfio da minha sombra,
Quiçá das minhas palavras.
E se eu te disser que o meu amor por ti
Acabou-se,
Não acredite,
Não medite,
Não aceite!
Apenas veja as minhas ações
De um gordo bêbado apaixonado,
Melhor dizendo, obcecado por ti.
Pelos teus sutis trejeitos alegres
Ou pelos teus revoltosos atos de nervosismo.
Eu te amo e nunca deixarei de te amar!
Por isso eu posso falar muito,
Posso até impressionar nos meus discursos,
Mas são apenas palavras bonitas que não se encaixam,
É tudo da boca pra fora, é tudo sem emoção,
Por isso confie apenas na minha ação:
De tentar tocar mais uma vez o seu coração!

Cão, Árvore, Cachorro E Poste

Cão, árvore, cachorro e poste.
Cão, árvore, cachorro e poste.
Não adianta!
Eles sempre serão usados
E permanecerão mijados sem reclamar!
Como escravas sexuais...
Ademais, essa é apenas
Mais uma de suas funções,
De suas utilidades propriamente não ditas.
Cão, árvore, cachorro e poste.
No final eles são apenas objetos,
De uma realidade que não existe.
E não adianta pensar sobre isso,
Pois você se tornará tão louco quanto eu!
E no final eles sempre serão,
Os imutáveis,
Os imensuráveis,
Os famigerados:
Cães, árvores, cachorros e postes!

O Nosso Caso

O nosso amor é um pretérito imperfeito:
Um passado não realizado que um dia
Há de se realizar.
Espero que não demore muito,
Pois estou preso neste gerúndio
Que não quero mais estar!
Apenas dê-me um beijo
Para o sofrimento acabar.
Apenas um leve gracejo
Pra eu voltar a te amar!